A condução de veículo sob a influência de álcool não é apenas uma infração de trânsito; transcende para o âmbito jurídico, impactando profundamente a vida dos cidadãos brasileiros, em especial dos cidadãos Matogrossenses.
Implementada em 2008 no Brasil, a Lei 11.705, popularmente conhecida como Lei Seca, foi editada com a finalidade de inibir o consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo automotor, se tornou símbolo da luta contra a direção sob efeito de álcool e da conscientização para o tráfego de veículos mais seguro. Há exatos 15 anos, a legislação estabeleceu a tolerância zero para consumo de bebidas alcoólicas e a infração passou a ser considerada gravíssima, com multa de R$ 2.934,70 e suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) por 12 meses.
Em Mato Grosso, de janeiro 2019 a abril de 2023 ocorreram 3.748 prisões por crime de embriaguez ao volante. Somente nos quatro primeiros meses deste ano foram 788, o que representa aumento de 24% em relação ao mesmo período de 2022, quando ocorreram 632.
O Código de Trânsito Brasileiro (CTB), em seu artigo 306, estabelece claramente a infração, definindo-a como a condução de veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou substância psicoativa. A legislação, ao ser promulgada, parte do pressuposto constitucional de preservação da vida e segurança, princípios fundamentais previstos na Constituição Federal.
Contrariando preconcepções, a acusação de embriaguez ao volante não deve ser encarada como uma sentença irrevogável de culpabilidade.
A legislação brasileira confere ao acusado o direito a uma defesa técnica, fundamentada em princípios robustos e provas. Nesse contexto, a análise do teste do bafômetro, a solicitação do exame de sangue como contraprova, a averiguação da legalidade dos procedimentos na abordagem, e a busca por testemunhas e evidências são ferramentas vitais na construção de uma defesa consistente.
Importante ressaltar que, à luz do princípio nemo tenetur se detegere, nenhum cidadão é obrigado a realizar o teste do etilômetro (popular bafômetro). Esse princípio, aplicável no direito processual penal brasileiro, consagra o direito do indivíduo de não produzir provas contra si mesmo.
Entretanto, a legislação brasileira permite que os agentes de trânsito realizem um teste de constatação se perceberem sinais de embriaguez no condutor, tais como sonolência, olhos vermelhos, dispersão, agitação, odor etílico, dificuldade de equilíbrio e etc.
É fundamental entender que, embora tal termo elaborado pelos agentes, por ser um típico ato administrativo, que goze de presunção relativa de legitimidade e veracidade, essa presunção pode ser elidida mediante a produção de provas em sentido contrário pelo condutor.
E como se dá a defesa no crime de embriaguez ao volante?
Contrariando a crença comum, é possível sim buscar defesa legal diante da acusação de embriaguez ao volante. Diversos aspectos podem ser explorados para contestar a denúncia.
Diante da abordagem de agentes de trânsito e a suspeita de embriaguez, o cidadão pode adotar um passo a passo para resguardar seus direitos e, principalmente garantir uma defesa eficaz: 1. Mantenha a Calma: Mantenha a serenidade durante a abordagem, evitando discussões acaloradas, principalmente respirando a autoridade exercida pelos agentes de trânsito; 2. Direito à Informação: solicite informações claras sobre o motivo da abordagem e as suspeitas levantadas; 3. Consciência dos Direitos: esteja ciente de que não é obrigado a realizar o teste do bafômetro, mas pode haver um teste de constatação, caso os agentes de trânsito vislumbrem a presença de sinais claros de embriaguez; 4. Não admita culpa sem orientação: evite fazer declarações sem a presença do seu advogado. Qualquer informação pode ser utilizada contra você; 5. Assistência Jurídica Especializada: caso a situação evolua para uma acusação formal, consulte imediatamente um advogado especializado em Direito Penal e Trânsito, solicite aos agentes o direito de informar um advogado e familiares sobre a situação e possível prisão; 6. Preservação de Evidências: documente o máximo possível, como recibos de consumo, fotografias e filmagens do local, para fortalecer sua defesa; 7. Realize uma defesa técnica: baseie a sua defesa em argumentos legais sólidos, explorando possíveis falhas nos procedimentos e testes realizados; 8. Compareça às Audiências: Esteja presente em todas as audiências promovidas pelo Poder Judiciário, acompanhado pelo seu advogado, para garantir que sua versão seja devidamente apresentada.
A jurisprudência brasileira, por sua vez, revela decisões que questionam a confiabilidade dos testes de alcoolemia e reconhecem falhas nos procedimentos de abordagem.
A doutrina destaca a importância de uma defesa técnica que não se restrinja apenas às evidências tangíveis, mas que também explore as garantias constitucionais do acusado.
Em resumo, a acusação de embriaguez ao volante não é uma sentença condenatória inabalável. Este artigo busca oferecer um guia informativo e esclarecedor, promovendo uma abordagem mais justa e consciente sobre o tema, enquanto defende efetivamente os direitos daqueles que enfrentam essa acusação, incorporando o respeito ao princípio nemo tenetur se detegere.
Compartilhar esse conhecimento é contribuir para uma sociedade mais justa e informada sobre o delicado equilíbrio entre responsabilidade no trânsito e garantias individuais asseguradas pela Constituição Federal.
André Luís Melo Fort é advogado, especialista em direito penal e processual penal e membro da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas – ABRACRIM.