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sexta-feira, 26/04/2024

A EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO COMO CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA por Diego Chaves Freire

Este artigo tem por objetivo entender o posicionamento adotado pelo
Supremo Tribunal Federal acerca da extinção do crédito tributário como forma
de extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária, prevista na
Lei n° 8.137/90, tendo em vista que há anos este tema vem sendo discutido
pela doutrina e jurisprudência, em que ora era admitida a extinção pelo
pagamento, ora não.

Com a crescente carga tributária nacional, houve um elevado númerode casos em que pessoas físicas e jurídicas optaram pela sonegação fiscal,seja na modalidade de supressão, redução de tributos, ou qualquer outra das
elencadas na Lei n° 8.137/90.

Consequentemente, houve o aumento de processos tributários e
criminais em tramitação no Poder Judiciário, nos quais buscam a execução dos
débitos tributários e a punição dos ilícitos penais.

Destaca-se que a lei sempre exigiu a caracterização do crime contra a
ordem tributária como a vontade livre e consciente do agente de realizar a
conduta proibitiva, inexistindo a atribuição da responsabilidade objetiva, por
presunção ou pelo simples fato de disposição estatutária.

DOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E ECONÔMICA:

Os crimes contra a ordem tributária e econômica estão tipificados na
Lei n° 8.137/90, e nela traz o rol sobre as disposições acerca de condutas que
buscam suprimir ou reduzir tributos, contribuições sociais e qualquer acessório.

Em todas as tipificações presentes nesta lei, exige-se a caracterização
do crime, ou seja, deve estar presente o dolo, a vontade livre e consciente do
agente de realizar a conduta proibitiva.

Desta forma, se a falta de recolhimento ou o menor recolhimento do
tributo for em virtude de culpa, não haverá a prática de crime.

Cabe destacar, que os crimes elencados na Lei n° 8.137/90 somente
recairá, sobre aqueles que efetivamente empregaram de forma livre e
consciente a supressão ou a redução do crédito tributário.

Ademais, na legislação brasileira inexiste a atribuição da
responsabilidade objetiva, por presunção ou pelo simples fato de disposição
estatutária.

Portanto, a responsabilidade criminal não pode ser atribuída a um
agente apenas por ele figurar como sócio ou administrador de uma empresa.
Inclusive, este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao
julgar o HC 171976/PA, sob a relatoria do Ministro Gilson Dipp.

Sendo assim, para que os sócios e administradores sejam
responsabilizados criminalmente é necessário que a autoridade administrativa
noticie a prática do crime contra a ordem tributária ao Ministério Público, para
que através deste seja feito a representação fiscal para fins penais.

Ressalta-se, que somente após decisão final pelas vias administrativas,
e exaurida todos os recursos cabíveis para o agente infrator que poderá ser
realizada a representação criminal, quando devidamente constatada a
existência de crédito tributário.

O Supremo Tribunal Federal, ao editar a súmula vinculante n° 24,
assim aduziu sobre o tema: “Não se tipifica crime material contra a ordem
tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do
lançamento definitivo do tributo” (Brasil, Sumula Vinculante n° 24, Supremo
Tribunal Federal, Brasília/DF).

Em suma, enquanto não ocorrer o lançamento definitivo do crédito
tributário não poderá ser considerada conduta ilícita. Portanto, será ilegal a
instauração de ação penal antes do exaurimento dos recursos e conclusão do
procedimento administrativo fiscal.

A EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO COMO CAUSA DE EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE NOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA –
POSICIONAMENTO ADOTADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:

A Suprema Corte firmou seu entendimento ao julgar os embargos
declaratórios da ação penal 516/DF, e os Ministros ao proferirem seus votos
formaram duas correntes, prevalecendo pela maioria dos votos o
posicionamento adotado pelo Ministro Luiz Fux.

Destarte, a primeira corrente, defendida pelo Ministro Ayres de Brito,
anuía que somente poderia ser extinta a punibilidade pelo pagamento integral
do débito tributário enquanto existente o processo penal de conhecimento, e se
já houvesse a sentença penal condenatória transitada em julgado não haveria
a possibilidade de extinção da punibilidade pelo pagamento da dívida.

Em seu voto o Ministro se posicionou reconhecendo que a extinção da
punibilidade pelo pagamento poderia ser analisada a qualquer tempo, tendo em
vista que trata-se de matéria de ordem pública.

Concluiria, assim, o meu voto por aqui, não fosse a alegação nova de
extinção da punibilidade pelo superveniente pagamento integral do
débito tributário, ou seja, pagamento que veio a ser efetuado
posteriormente à sessão de julgamento. Pelo que, por se tratar de
questão de ordem pública, é caso de sua apreciação, até mesmo de
ofício, por este nosso Tribunal. (STF, Embargos de Declaração da
Ação Penal n° 516 ED/DF, Rel. Ministro Ayres Britto, Julgado em 05
de dezembro de 2013).

Posteriormente, discorreu sobre o momento em que o pagamento pode
ser realizado para que a punibilidade do infrator seja extinta. Concluindo que,
após decisão condenatória definitiva e o anúncio do cumprimento da pena a
pretensão punitiva do Estado já estaria concretizada, impossibilitando o
reconhecimento da extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo.

Atento a esses marcos interpretativos, tenho que a jurisdição do
Supremo Tribunal Federal, quando exercida em única ou última
instância, prescinde do trânsito em julgado para que sua decisão
ganhe foros de definitividade. Definitividade que limita, então, a
possibilidade de reconhecimento do pagamento do tributo como
causa de extinção da punibilidade, por não mais existir pretensão
punitiva do Estado passível de suspensão, ou anulação. Nesse fluxo
de intelecção da matéria, entendo que, por mais relevantes que
possam ser as razões de política criminal (vinculadas a instrumentos
de arrecadação fiscal) que levaram à criação da causa de extinção da
punibilidade em questão, não tem ela o alcance de rescindir
condenação criminal definitiva, ainda mais quando tal condenação
seja originária da mais alta Corte do País, sob pena de temerário
desprestígio à Jurisdição Criminal do Estado. O que me leva a
concluir que, uma vez exercida em definitivo a pretensão punitiva
estatal, fica inviabilizada a eficácia jurídico-penal do pagamento
integral do débito tributário no caso concreto, para efeito de extinção
da punibilidade. (STF, Embargos de Declaração da Ação Penal n°
516 ED/DF, Rel. Ministro Ayres Britto, Julgado em 05 de dezembro de
2013).

Neste contexto, o Ministro Ayres Britto estabeleceu em seu voto no
sentido de indeferir o pedido de extinção da punibilidade pelo pagamento
integral do débito tributário posterior a condenação penal, sendo seguido pelos
Ministros Teori Zavaski, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa.

A segunda corrente adotada pelos demais Ministros, defendia que o
pagamento do tributo realizado a qualquer momento extingue a punibilidade do
crime, nos termos do § 2º, do artigo 9º, da Lei n° 10.684/03, sendo o
entendimento que prevaleceu pela Suprema Corte.

O pagamento do tributo, a qualquer tempo, extingue a punibilidade do
crime tributário. Defende que o art. 9º da Lei n. 10.684/2003 não foi
revogado e continua em vigor. Ao contrário das leis de ns.11.941/2009 e 12.382/2011, a Lei n. 10.684/2003 trata de pagamentodireto (e não de pagamento após parcelamento). Assim, o pagamentointegral implica a extinção da punibilidade por força do §2º, do art. 9º
da Lei n. 10.684/2003. (CAVALCANTE, Marcio André Lopes.

Principais julgados do STF e STJ comentados, 1ª Edição, Manaus:
Editora Dizer o Direito, 2014, p. 804).

Sendo assim, a segunda corrente defendia que a Lei n° 12.382/11 que
perfilou a extinção da punibilidade em decorrência de parcelamento tributário,
não afetou o disposto elencado no § 2º, do artigo 9º, da Lei n° 10.684/03, que
prevê a extinção da punibilidade pelo pagamento do débito a qualquer tempo.
Deste modo, o Ministro Dias Toffoli proferiu o seguinte posicionamento
em seu voto.

Como já tive a oportunidade de sustentar, penso que a Lei nº
12.382/11, que regrou a extinção da punibilidade dos crimes
tributários nas situações de parcelamento do débito tributário, não
afetou o disposto no § 2º do art. 9º da Lei 10.684/03, o qual prevê a
extinção da punibilidade em razão do pagamento do débito, a
qualquer tempo. Como referido por Luiz Flávio Gomes et al. (Os
crimes tributários e a extinção da punibilidade. Conjur, 17/3/11), “é da
tradição jurídica brasileira a previsão de causas extintivas da
punibilidade pelo pagamento, jungidas aos crimes materiais contra a
ordem tributária, tendo em conta a particularidade do bem ofendido (o
patrimônio público). Por razões de política criminal (e arrecadatória)
do Estado[,] quase sempre se preferiu receber o quantum devido [a
se aguardar] processo ou condenação criminal. Os tributos custeiam
serviços públicos essenciais. Melhor arrecadá-los que condenar
criminalmente o contribuinte. Muitos veem nisso um privilégio odioso,
que favorece precisamente os mais aquinhoados.” Comungo dessa
linha de pensamento. Ressalto, porém, que se trata de opção que, a
meu ver, não se submete ao aventado controle de
constitucionalidade, estando dentro da discricionariedade conferida
ao Parlamento – até porque quem pode o mais pode o menos. (STF,
Embargos de Declaração da Ação Penal n° 516 ED/DF, Rel. Ministro
Ayres Britto, Julgado em 05 de dezembro de 2013).

Diferente do entendimento do Ministro Ayres Britto (Relator), Toffoli
defende que o parcelamento apenas suspende a pretensão punitiva por parte
do Estado, e que este processo deverá ser formalizado antes do recebimento
da denúncia no procedimento penal. Já o pagamento poderia dar-se em
qualquer momento da persecução penal.

Sendo assim, a primeira corrente defendida pelo Ministro Ayres de
Brito fora vencida, e a Suprema Corte adotou a segunda corrente em que a
extinção da punibilidade dar-se-ia em qualquer momento desde que ocorresse
o pagamento integral dos débitos tributários, pois entenderam que o legislador
optou por privilegiar a arrecadação estatal, utilizando-se da coação penal como
um meio para obter a satisfação integral do débito tributário.

Diego Chaves Freire, advogado, inscrito na OAB/MT 23.165, pós-graduado
em direito público pela ESMAFE/RS e UCS, professor de direito tributário
da UNIMAFA (Polo Colíder), presidente da comissão de direito tributário
da 11a subseção da OAB/MT.

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