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sábado, 21/09/2024

Exame de Ordem – Exigência Constitucional

Álvaro Fernando da Rocha Mota, Presidente do Instituto dos Advogados Piauienses
A Constituição da República do Brasil, ao dispor, no Capitulo IV do Título IV, sobre as funções essenciais à Justiça, referiu-se à advocacia em três seções: II III e IV, respectivamente – Da Advocacia Pública, da Advocacia e da Defensoria Pública.
Especificamente sobre a Advocacia, sem adjetivação como o fizera na seção anterior, subentendendo-se que, não sendo advocacia pública, se-lo-ia advocacia privada, ainda assim determinou: “Art.133 – O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”
Ora, verdadeiramente, se tal foi estabelecido na Lei Maior, há que se exigir do advogado pleno conhecimento do seu atuar profissional, no sistema que administra a Justiça.
Mas, como fazê-lo logicamente, incumbe ao próprio Estado aferir a condição de a pessoa que vai atuar no âmbito judicial estar devidamente preparada intelectual e moralmente para tão importante mister.
A OAB recebeu a incumbência de verificar a capacidade de quem pretende exercer a advocacia. Esse processo, regulado em lei e subsidiado por regramentos internos da entidade, tem seu fundamento na importância da função advocatícia, a par de, como ocorre com os magistrados, membros do Ministério Público e outros agentes públicos, devam os que se propõem a advogar, comprovar sua aptidão para tanto.
Note-se que a Advocacia representa, em nossa legislação, o passo inicial para a submissão a processo seletivo de outras profissões jurídicas.
Assim, do mesmo modo como exigido ao ingresso na Magistratura e no Ministério público, há que se submeter o bacharel em Direito a processo que apure sua proficiência para o exercício da Advocacia.
Ainda que seja patente sua necessidade para aferir a proficiência do profissional advogado, não têm sido poucas as tentativas de extinguir o Exame de Ordem. Inúmeros projetos de lei foram apresentados ao Congresso, de muitos anos a esta data. Vozes levantam a desnecessidade, chegando-se, até mesmo a considerar absurda essa exigência, na comparação com outros profissionais aos quais se autoriza o exercício para o qual se habilitaram em curso específico.
Inexiste fundamento forte o bastante para legitimar a extinção desse processo seletivo, em contrário à justificada exigência no texto constitucional. Senão, veja-se, o dispositivo supra referenciado – artigo 133, inclui o advogado na administração judicial. Ora, se os demais integrantes dessa administração da justiça são bacharéis em Direito selecionados mediante concurso público, a fim de que comprovem estar aptos ao exercício da função, como dispensar o advogado, esse terceiro integrante na relação jurisdicional, de comprovação de sua habilidade para o exercício de sua função? O tratamento de um dos três pilares da administração da justiça – o advogado – seria diferenciado dos outros dois – juiz e promotor, resultando, nessa diferenciação, prejuízo para a cidadania, vez que a função do advogado, nesse contexto jurídico, é exatamente defender os interesses dos cidadãos, individual ou coletivamente.
A Lei n.8.906, de 1994 – EAOAB, ao fixar a competência da OAB, estipula, em seu art.44, II: “promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil”. A obrigatoriedade do Exame de Ordem significa o domínio, pela OAB, de instrumento seletivo apto a possibilitar um perfil nacional do advogado e, face à competência do Conselho Federal para sua regulamentação (art.8º, parágrafo 1º, EAOAB), padronização nacional mediante a qual será possível fixar bases de qualidade. Obviamente, que, segundo esse modelo, sabido que o bacharel enfrenta, no Exame de Ordem, a si mesmo, por inexistir número fixo de vagas nem mesmo ordem de classificação, põe-se o fato de que a aprovação nesse exame e o atendimento a outros requisitos postos na mencionada lei reguladora da advocacia, de modo a garantir a inscrição do bacharel na OAB, o que é executado em Seccional de Estado ou do Distrito Federal, capacita-o ao exercício profissional em todo o território brasileiro.
Uma reflexão se impõe, relativamente ao exame de ordem – o seu prazo de validade.
Inexiste prazo para que o bacharel, aprovado no exame de ordem, promova sua inscrição como advogado. Significa que o bacharel nele aprovado, ainda passadas décadas, é considerado apto para o exercício profissional. Ora, sabido que o dinamismo social e as mudanças legislativas, delas reformulando profundamente o modus operandi processual e alterando substancialmente institutos jurídicos, transformam o direito e passam a exigir novo perfil profissional do advogado. Aquele bacharel de conhecimento ultrapassado poderá exercer a profissão, participando da administração da justiça!
Eis que deve ser enfrentada essa situação, talvez não muito frequente, porém mesmo assim relevante, face à importância da defesa dos direitos do cidadão e da exigência de uma boa e justa garantia de justiça.
Mais que isso, pela vocação constitucionalmente fixada para o exercício da advocacia, há que ser exigida comprovação da habilidade do bacharel para que possa ser autorizado a esse exercício. Ausente tal verificação de capacidade contrariado estará o modelo de equilíbrio da administração da justiça estruturado pela Constituição da República brasileira.
Álvaro Fernando da Rocha Mota é advogado. Procurador do Estado. Ex-Presidente da OAB-PI. Mestre em Direito pela UFPE. Presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.
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